Exumação
Nado para fora da terra Inalando enxofres O barro na língua Deslizo e relo sobre vermes Azedos, viscosos, melados Pulso, goela e costelas…

Nado para fora da terra
Inalando enxofres
O áspero barro na língua
Deslizo e relo nos vermes
Azedos, viscosos, melados
Pulso, goela e costelas
esganados por sete palmos
A carne pútrida luta
em carne viva
contra o perfume da morte
que arranha as mucosas
Mas nada opõe o punho
Nada mata o nado
para fora da terra.
Enfim, os dedos frestam a luz
e unham o ar
O ar por qual se chora
no rompante da vida
ao se pôr nos primeiros braços
O ar que risca a faringe
Penetra gélido e escapa cálido
do abraço das vísceras
O ar! O corpo sibila outra vez!
Pois no solo deixo a lama
A cova na qual eu pus era
Funda feito via esofágica
Vislumbro a umbrosa janela
e recordo os sentidos
O vento assobia a traqueia
O ido
já era
As rimas há muito perdidas
Éden de Adão e Eva
Desabitaram o jazigo
E contemplo comigo a treva
Venço de novo o inimigo:
Mais uma certidão de óbito
e outra de nascimento.
